20.2.09

Ressentimento

Escrevendo sob encomenda renego o meu tema. De cara e sem pestanejar. Aviso logo que falarei sobre escavações mineralógicas. Fósseis. Ponto-cruz. Trânsito.
Falar sobre ressentimento é como repetição. Pisar mil vezes na mesma poça. Sujar mil vezes o sapato.
Ressentimento é apego ao amargo. É chupar um dedo azedo. É guardar vômito para cheirá-lo ocasionalmente.
Ressentimento é miolo de pão. Com água, incha.
Preenche espaço que poderia ser utilizado para torta de maçã. É como comer cinco quilos de farinha antes de um banquete. É o mesmo que se alimentar de olhos de minhoca: ineficaz. Não funciona, não presta.
Ressentimento é um ciclo vicioso de maltratar o coração com o passado.

O certo é matar os sentimentos(-re). Uma lesma morre com sal sobre ela. E sentimentos prescritos serão superados com a boa dose de presente. Coisas leves que extraímos das árvores, do céu azul, do pássaro colorido.
Funciona como sal, como bálsamo.

Mudemos de assunto, porque isso já passou.

17.2.09

Paz iletrada, inominal, infame.
Seria lícito aprontar-se, será verdadeiro?
Pronto está. Pronto está o começo.
Desde agora e
................................... para sempre.

Imag
.....ine
Imagem da
.....imaginação

Atalho
...palavra de
de tempero

Boca palavra de
c o n t o r n o.

Cal
....cula
.....dora : por que tem números nela?

VoraZ
.....Letras do fim

Fim. palavra do silêncio.

15.2.09

Que será?

Voz redonda de veludo cândido
Cortina de renda em casa bonita
Uva sem caroço. Cor vibrante de ameixas
Imponência de sorrisos tímidos
Ninho de pássaro-filhote
Cheiro de férias. Tonalidades de pôr-do-sol
Picolé em dia de praia
Anel favorito, herança de avó
Gargalhada de tio engraçado
Água em tempos de sede
Carinho nas mãos. Beijo nos dedos

Delícia
Rendição eterna.

- É amor? - grita o interlocutor.
- É começo - berra o povo.
- Tem perigo? - vacila o gritante.
- Esperança - entoa o berreiro.

11.2.09

Mar inundado

O dia em que o mar inundou, só o Deus do céu explica. Foi abundância para tudo que é lado. As rosas nasceram com quinhentas pétalas. O sorvete veio com quinze bolas. E cada pessoa dava dois sorrisos por vez.

O dia que o mar inundou foi uma aguaceira só.
Tudo no mundo ficou molhado:
os olhos;
saliva;
carga de caneta.
Os sentimentos ficaram liquefeitos e todos ficaram molengas. Quem tinha raiva, ficou com preguiça. Quem tinha aflição, ficou com tédio. Quem tinha paixão, ficou com vontade.

E assim passava o dia. Na inundação do mar.

Tudo se tornou beira, até que se tornasse fundo. As praias de cada um viraram oceano. Nem montanha virou ilha. Nem cume deu conta de ser tão alto.

Que dia!
Dentro das mãos das crianças cabiam rios inteiros.
E dentro da blusa dos outros brotavam corais.
Coisa esplêndida.

Aquele dia.
Tinha um murmurar de delírios doces. O amor incidiu graciosamente sobre a humanidade. A ponto dos cânticos serem a nova linguagem.
Homens viraram reis e mulheres rainhas, reinantes num reino de nuvens.
E tudo era verdade.
E tudo sossego.
Em tudo paz.

Afoguei-me de tanto mar. Só nesse dia morri seis vezes, queria, porém, ter vivido mais dez óbitos.
Pena, o dia acabou.

1.2.09

{ }

Sobrou espaço para uma poesia.
Mas tem que ser pequena, que me falta espaço.
Mas tem que ser rápida, porque digeriram o tempo.