22.10.14

Mostarda e mel

Na sala em que eu trabalho há uma foto de Buenos Aires. Uma panorâmica da Avenida 9 de Julio. Uns prédios enormes, um anúncio da Samsung e o Obelisco. De vez em quando me pego dentro da cidade, olhando para o céu estupidamente azul, observando aqueles carros da década de 90 passarem. Nostalgia, acho. Essa viagem me dá nostalgia porque não convivo mais com ninguém que tenha participado dela: nem eu sou a mesma. Sinto saudade daquelas pessoas. Sinto muito. Por outro lado, olho ao redor e vejo que, em maior ou menor medida, estamos todos bem. Então, tudo certo.

Acho que poucas coisas são mais deliciosas do que ser chamada de guapa, saí da boca deles se derramando. Que linda, que linda. Numa espécie de feitiço, os hermanos são todos seus. Eles são assim charmosos e possuem umas jaquetas e penteados impronunciáveis. Umas barbichas estranhas: absolutamente irresistíveis: a Argentina.

Eu sempre achei que me apaixonaria só uma vez. Mas, posso dizer, minha profecia ficou caduca. Me apaixonei uma vez e amei outra vez. Mentira. Não faço a mínima ideia de como classificar minhas vivências. Só sei que foi bonito, intenso e bom. Depois, foi o caos. Dor no peito, sensação de finitude completamente sufocante. Assim é a vida. Uma alternância imprevisível de bala Juquinha com chá de boldo. Uma hora está tudo muito docinho, outra hora uma amargura difícil de engolir.

Mas, a gente engole. E depois até repete. Só não sei se a gente se convence de que isso é normal. As coisas se esfarelam. Areia é farinha de montanha e fica lá na praia, pra sempre beijando o mar.(Espertinha) Estou farelo de mim mesma sem saber se luto para me recompor ou se mantenho a nova forma. Umas decisões bizarras e cogentes. Viver é um grande truc.

E se você perguntar: tá triste, garota? Digo: olha, tô triste não. Só tô olhando. – Sabe aquele estado de observação em que ainda não estamos bem certos do que sentir e de como interpretar os acontecimentos? Aí, a gente fica assim com a alma meio parada, come esfirra, vê um filme, até que, de uma hora para a outra, a gente desperta, com um pensamento já pronto e quase tudo resolvido.

Tô olhando e comendo esfirra, meu senhor. – Na fila de espera de mim mesma, aguardando o ardente desfecho. - E espera até quando? – Ex-pêra. Não sei, tô numa vida de repolho, na suavidade da alface americana.

Sabe? – O quê?


Sei lá.

3.10.14

Auto-ajuda nombre deux : tenha calma nas horas de pânico.

Acho isso uma palhaçada, primeiramente. Se o momento é de nervosismo, não peçam calma, sob pena de desconstituir o momento mais legítimo de todo ser humano: a agonia.

Mais uma vez, venho dar dicas inúteis, mas que, prometo, serão honestas e alcançáveis. Veja que estar com raiva e inconformado pode ser muito importante para resolver situações há muito negligenciadas. Portanto, eis que vos digo: vomita! Vomita tudinho que está te sufocando e se o mundo explodir depois, vida que segue. Viveremos em outra galáxia, então.

Tenho certeza que a maioria das coisas não ditas e as esperas dissimuladas são a grande causa da nossa degradação pessoal. Na seleção hercúlea do que podemos ou não dizer, calamos nossa própria existência e viramos um fantoche desconexo e ridículo.

1) Não seja ridículo.
Não seja ridículo.

Nesse sentido, minha sugestão é que a angústia, raiva e sensação de que está tudo uma bosta sejam encaradas como emoções legítimas de serem sentidas e, mais do que isso, legítimas de serem vividas. Por isso, se alguém vier te acalmar, seja ignorante e estúpido. Melhor não. Assim acabaremos sozinhos. Por isso, se alguém vier de acalmar, sorria. Melhor não. Se alguém vier te acalmar, fale: afaste-se ou sofrerá as consequências.

2) Afaste-se ou sofrerá as consequências.
Faça cara de fúria e de quem come miojo cru, com fungo, caído na lama do terreno do vizinho (selvagem).

Tem horas que as coisas dão errado, sim. E é comum que a gente odeie essas fases onde tudo de ruim vem junto. Se alguém perguntar como você está, diga a verdade. Como você está? Tô horrível.

3) Tô horrível.
Horrível mesmo.

E se alguém vier te perguntar qual é o seu plano. Diga: Não tenho planos. E se começarem a inventar saídas e soluções pra sua vida. Bem, a intenção pode até ser boa, mas é como alguém que tenta escovar os dentes de outra pessoa: cai baba e pasta por todos os lados, sem que a limpeza seja eficaz.

4) O que fazer? 
Você me pergunta.

Eu acho válido não comer, não tomar banho, desligar o celular. Sem claro que isso afete sua saúde e das pessoas à volta. Mas o que eu quero dizer é que o luto é vital. Admitir-se fraco, triste ou desanimado é saudável. É ruim? É! Muito ou pouco? Demais! Mas são nesses períodos mais críticos em que entramos em maior contato com a gente mesmo. Sentir dor é terrível, entretanto, aponta para nossa vida e sensibilidade.

Brigue. Grite. Chore.
Tombe.


Mais tempo, menos tempo, um sorriso se arreganhará na sua cara. E na minha, espero.