11.2.09

Mar inundado

O dia em que o mar inundou, só o Deus do céu explica. Foi abundância para tudo que é lado. As rosas nasceram com quinhentas pétalas. O sorvete veio com quinze bolas. E cada pessoa dava dois sorrisos por vez.

O dia que o mar inundou foi uma aguaceira só.
Tudo no mundo ficou molhado:
os olhos;
saliva;
carga de caneta.
Os sentimentos ficaram liquefeitos e todos ficaram molengas. Quem tinha raiva, ficou com preguiça. Quem tinha aflição, ficou com tédio. Quem tinha paixão, ficou com vontade.

E assim passava o dia. Na inundação do mar.

Tudo se tornou beira, até que se tornasse fundo. As praias de cada um viraram oceano. Nem montanha virou ilha. Nem cume deu conta de ser tão alto.

Que dia!
Dentro das mãos das crianças cabiam rios inteiros.
E dentro da blusa dos outros brotavam corais.
Coisa esplêndida.

Aquele dia.
Tinha um murmurar de delírios doces. O amor incidiu graciosamente sobre a humanidade. A ponto dos cânticos serem a nova linguagem.
Homens viraram reis e mulheres rainhas, reinantes num reino de nuvens.
E tudo era verdade.
E tudo sossego.
Em tudo paz.

Afoguei-me de tanto mar. Só nesse dia morri seis vezes, queria, porém, ter vivido mais dez óbitos.
Pena, o dia acabou.

2 comentários:

Bianca disse...

Seu blog é Fascinante!

Tô muito feliz!

Desculpe de novo! =]

Miguel Del Castillo disse...

indiquei esse texto pra uma amiga e depois vi que não tinha comentado. acho que é dos meus preferidos aqui!

eu gosto desses murmurares de delírios doces. Coisas meio sinestésicas, sei lá. Muy bueno.