13.5.15

Soprimentos

Se eu fechar meus olhos agora, chego num Canyon, daqueles que eu nunca fui. Eu tenho aquelas botas que nunca comprei, mas a boca que beijo é a sua – que já tive, tenho e quero sempre mais.

Seu cabelo vai ter crescido e você terá um dente prateado, só pra fazer graça quando ri. Seu nome até lá terá mudado para Billy Joe e você usará uma pulseira de couro de urso e um cordão de dente de unicórnio. Até lá a outra tatuagem já terá vindo, depois da viagem para Índia. Nesse tempo, nos tornamos macrobióticos e só comemos coisas enormes.

A vida vai passar devagarzinho, com a leveza de um trem de interior. Teremos dias de mato e de muitas flores. Teremos uma horta num barco e comeremos baleias assassinas. Ninguém vai mais fazer imposto de renda e não teremos tempo sobrando para a aposentadoria.

Nunca mais assinaremos nada e mais de três papéis não poderão ser reunidos na mesma mão. Todos os setores administrativos do mundo acabarão. Os de execução vão andar por eles mesmos, cada qual com seu cada um.

Se eu fechar meus olhos agora, estamos numa montanha e eu tenho um gorro colorido. Seus olhos continuam brilhando, seu nariz escorre por causa da temperatura gelada. Seus lábios estão rachados e esbranquiçados. Estamos em silêncio e profundamente felizes. Há tempos não víamos neve. Celebramos com um vinho que você escondeu por todo o percurso.

Num piscar de olhos estamos numa cidade. Mil cores cintilantes, é noite e você quer perambular. É dia e a rotina nos prende. Madrugada e eu invento uma profecia. Levantamos a âncora e o vento nos faz dar voltas.

Aprendo a fazer pizza sem glúten, faço macarrão de abobrinha e cachorro quente de unha e intestino de frango. É possível que meus peitos caiam, mas meus olhos estarão notadamente melhores – caberá muito mais mundo. Vou saber tocar gaita ou flauta, cortarei meu próprio cabelo e farei depilações temáticas. Vai ser tudo muito bom.

Amanhã, especificamente, vou a Olaria. Ora, toda travessia começa em algum lugar, não é mesmo?


Par se ir ência.

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