3.6.14

Elixir

Eu precisava de algum espaço para entender minhas novas dimensões. Por um instante me dei conta de que nada havia mudado. Como se eu tivesse piscado e tivesse adormecido dentro daquele segundo. Dormido e levantado, sonhado em uma faísca de tempo.

Meu personagem favorito estava em seu último trecho: o fim da saga. E eles não se amavam mais. Nunca mais. Ele parecia feliz com o novo desfecho, mas eu não. Parei de achar engraçado. Eu queria que a nova obra fosse a reprise do passado. Mas não. Ele mudou, a mulher o deixou e ele ficou sozinho com uma chinesa. Pra conseguir um visto. Sem lutar para reconquistar o amor daquela que o abandonava. Mas eu estava lá, fincada. Esperando que, ao menos, ambos ficassem sozinhos e tristes. Seria um final feliz. Porque há uma dificuldade absurda em enfrentar novos amores, diante daqueles gigantescos e vultuosos que já conhecíamos. Uma preguiça de viver uma alegria ou qualquer expectativa.

A maturidade traz consigo o desmoronamento do imperativo.  Nada é pra já. Sempre e jamais nunca existiram. Não sei se liberta ou intimida a consciência de que é possível amar muitas e muitas vezes. Não sei se consola ou estraga saber que não morreremos de saudade ou por amor ou de amor. Não sei se inquieta ou acalma perceber que a vida é um ciclo e que sobrevivemos a quase tudo.

Digo que sobrevivemos a quase tudo porque muito de nós tomba no caminho. E fica sem ser enterrado, belo caminho, com a boca cheia de terra, com as unhas meio sujas, um vestido roto. A gente morre. Morre aquela ingenuidade de achar que tudo vai dar certo. E começa a entender que tudo pode dar certo. Que não existem garantias, mas que a felicidade está aí para ser mordiscada.

Odiei ver o fim dessa trilogia. A partir de agora, para reve-los preciso repetir as estórias e ver os mesmos diálogos. A gente tem saudade, sem ter condições de perguntar o que mais acontecerá. A gente nem sabe se eles continuam a viver ou se os personagens congelam depois que os créditos sobem. A gente fica sem saber como a vida funciona. É estranho. Muito ruim. Às vezes era até melhor não ter continuação.

Percebo que o fim causa um espanto e uma certa comodidade. Todos os dias somos seduzidos e convidados a nos esvaziar da esperança no eterno.

Pois
bem
acabou

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