3.5.09

Selvagem

Daqueles que comem verduras e destroçam ventres.
Daqueles que têm língua de navalha e cabeça de mel.

Malvados, cínicos do mundo!
Canastrões! Faceiros
Lindíssimas criaturas que mentem, envolvem com piadas incorretas.
Moralmente reprováveis, eticamente os louvo.
Porque são livres deles mesmos e em tudo transborda amor: em não ser sempre sendo

ainda mais

Como se voltas fossem feitas de pontos curvilíneos
Como se lençóis fossem feitos de paz.
Como se fossem de algodão as mãos. Como se a esperança se tornasse grama macia.

E é como se tudo ficasse amorfo e andasse como pato.
pés abertos, peitos esticados para o ar

Cabelo enrolado daqueles que se alisam de tédio
Olhos de quem repara em poesias ocultas, que cabem nas patas de um mosquito
Força! Gutural de uma formiga.
Balanço gostoso de viração marítima.
Daquelas que rodam a gente. Bamba bamba, danço na natureza linda.

vejo tudo ritmado
vilas, palhaços.
dentes que me mostram alegria
sorriem

perdi uns dentes. levei soco na boca
cuspi meu maxilar inteiro e nasceu uma flor carnívora
exótica, mordente

Ah, que exaltação
As palavras ficam germinando, jorrando do poço
Jogadas a metros de infinitos, de imensidão.
Umas vão tão distante que as perco indefinidamente

rodopio de sensações
cansaço de vida
terra no rosto
sou negra, marrom, sou onde se plantam

sou notas, sou arcos
sustento
sou frígida. fingidamente calma

sou máscara
imponente escritora de fantasia
mas eu acredito
respiro meus delírios, os vivo
os almejo, como
mastigo
engulo
meus mundos são digeríveis, são alimento

passo
paro
passo, paro
deito
cheiro
nevoando e, sem mais outros instrumentos, canto sozinha, mexendo os pés na minha melodia
espalhando as folhas secas
e criando pétalas

antes de me nascerem sonhos, criei por séculos e mais séculos
criei pétalas. enroladas e coloridas, escondidas dentro da minha planta.
desenhei minhas folhas como quem transporta sua vida para uma semente
como quem se projeta na espera

enrolei-me de tal modo que cresci sem perceberem. fiquei gigantesca e de noite, aumentava minha existência.
preenchi diversos planetas enquanto crescia, sem flor - sendo folha
e ninguém via que a vida me brotava

em um dia
abri
estiquei meus braços e disse:
o mundo é meu
peguei minhas flores, as arrumei em meus olhos
e disse:
perfumem meu mundo
arrumei a minha terra e disse:
nutra-me eternamente

o que vale é a paz cravada, é a vontade que escorre por entre lábios
são palavras! ditas!
Bramidos!- sussurrados

Tragam-me boas notícias.
Quem vos fala é quem vos flore.
Eu sou de pluma, sou doce, sou mansa
Sou mirante. Miragem não.
Sou criadora de pétalas. Riacho escondido.

Refresquem-se em mim, que eu vos rego com Deus.
Bons vocábulos.

4 comentários:

patrícia disse...

:~

ai, vivi.

Unknown disse...

Selvagem como a existência?

"sou máscara
imponente escritora de fantasia
mas eu acredito
respiro meus delírios, os vivo"

seu texto tem um frescor, uma novidade tão palpável. as palavras saltam da tela. e dos olhos. existem. me encanta!

Miguel Del Castillo disse...

me encanta também, Vivi.

tentei selecionar alguma coisa desse texto, mas não consegui. ele é inteiro. eu iluminaria ele todo. cheio de luz, de vontades.

obrigado pela flor. que bom que se esticou

obrigado

Felipe Reina disse...

humm...me senti um cãozinho...bicho domesticado.
Ótimo.