Há horas na vida em que os sinos
tombam e o tempo esquece de ser marcado. Os dias se tornam uma continuidade
fluida de acontecimentos assimétricos. O passado e o futuro ficam
constantemente se beijando, deixando o presente de lado – entediado e
bocejante.
Muitas memórias nos acordam,
roçam nas nossas bochechas e nos dizem bom dia. Entre um cochilo e outro, sonhamos
com o porvir. Sem maturar o desejo: se as expectativas devem ser empunhadas ou
rechaçadas. Nesse terreno lodoso, patinamos por paisagens espetaculares. Amores
antigos. Risadas macias. Olhinhos brilhantes. Dá saudade daqueles que morreram
na nossa vida. Pessoas que se distanciaram e nunca mais voltarão.
Dentre todas as palavras que
aprendi, uma se ampliou dentro de mim. Desilusão. Não falo como quem parte de
uma orla de tristeza, mas como um cachimbo na boca de um velho sem dentes. Como
quem observa a vida, sem o interesse de mastigar coisa alguma.
Eu encarava promessas com a
tranquilidade de quem recebe um título de crédito. A palavra como sendo um
legítimo penhor. Ah, miragens. Mentiras e desculpas empilhadas sobre a minha
cabeça. De onde tiramos tanta inocência? Com que forças voltamos a recreditar
no amor over and over again?
Olhando ao redor, vejo tanta
coreficina. Gente que acreditou no amor e quando abriu os braços, recebeu uma
pá na cara. Sem elegância, sem charme. Acabou ficando estirado no chão, com um
nariz que saia meleca e sangue, olhos de muito mimimi e lágrimas. Quando é comigo, penso que a cena não é tão feia, mas olhando o desastre dos outros,
percebo que se desiludir é uma espécie de estrangulamento da esperança. Um lance
pesado e quase insuportável.
Mas, voltando ao meu cachimbo e
minha barba por fazer, vejo que de alguma maneira a pessoa se recria. Deixa
aquela carcaça alvejada no chão e parte para outra existência. Às vezes se
reinventa, às vezes se repete. Eu fico pensando que isso é um milagre
deslumbrante. A capacidade do ser humano de se reerguer apesar dos pesos dos
pesares. Riscam a cartilha inteira, arrepiam as certezas, peidam na nossa
farofa emocional, mas aí arrumamos outros papeis, reorganizamos as verdades e a
farofa que se dane. Bem, jáamais e amareis de novo.
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