Corra, Hannah. De traz em frente, de frente, para,
trás.
Acordei ao som de uma britadeira intermitente,
sentia meu ventre doer. As cólicas mensais haviam começado. Abro os olhos e
vejo uma coruja de pelúcia me encarando com olhos amarelos purpurinados. Ainda
é cedo, mas a cidade já está em obras. Tomo leite. Vitaminas em cápsulas. Mais
leite. Arrumo a casa, com esmero. Vejo a panela que ariei, praticamente limpa.
Reverencio meu desengordurante “BANG”. Eu emagreci, a despeito de todo
chocolate e quinquilharias que comi na semana passada. Acho um pregador de
roupa de madeira, uso para prender meu cabelo em coque. Lembro da minha mãe.
Guardo a louça. Guardo meus anéis. Dobro minhas calcinhas. O céu está azul.
Minhas pernas estão doloridas.
Sento em meu tapete cinza felpudo. Fecho os
olhos e jogo minha testa para o teto. Só penso em amores geométricos. Há três
dias penso nisso. Na academia, pensei no triângulo isósceles e meu apreço por
seus dois ângulos iguais. Quando pequena, adorava meu caderno de desenhos
geométricos. Tinha um compasso que a ponta afundava a despeito da infinidade de
gambiarras desenvolvidas para tentar consertá-lo.
Não entendo porque o triângulo equilátero não
me mobilizava da mesma maneira. De qualquer forma, entendi perfeitamente que
amores são e sempre serão geométricos. Mas não sei explicar.
No começo, achava que amávamos em reta, um sentimento
que se expandia para os dois lados, no infinito e, para mim, na unidade
infinita do tempo: eterno. Um amor eterno, infinito, contínuo e fluido.
A vida picotou um pouco minhas retas. Fiquei um
tanto segmentada. Paixões de verão. Amizades do curso de inglês, o prazer de
estar no mar. E, de uma hora para outra, parecia que eu vivia pequenos
segmentos que poderiam se sobrepor, se cruzar ou se distanciar, intervalado por
imensos vazios. Tudo tinha início e fim evidentes.
Sei que círculos e hexágonos também são
geométricos, mesmo o rosto de muitas atrizes. Mas não quero pensar nisso.
É mais seguro amar em segmento de reta. Entretanto,
é do precipício que sentimos as alturas. A experiência me ajudou a manejar
melhor meus pedaços, acabei por construir uma aptidão : o recorte póstumo e o
nó. Quando uma relação se exaure, não deixo as sensações expostas. Como linhas
feitas em tranças, corto seu final desgastado e podre, amarro o fim, para que a
estória não se desmanche. Tão importante quanto amar é aproveitar a memória do
amor. Meus ex-amores são frescos e conservadões.
Fico irritada em pensar no que você está
pensando e na diminuta possibilidade de não concordar com meus argumentos. Bem,
muitas imagens são possíveis para representar o amor, pois ele é elástico como
uma fumaça. Particularmente, abri um novo plano e optei pela semirreta. Quero
um recomeço, mas anseio por um futuro. É tempo de semirretas na minha folha quadriculada. Não se embanane com minhas metáforas. Assimile o que ofereço e tente
entender.
Assimile o que ofereço e tente entender. Às
vezes,
não dá.
não dá.
Os tapetes da cozinha estão manchados de azul.
Tenho que limpar meu sapato e fazer legumes no forno.
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