17.4.09

O Dia do Cospe Pérolas

Num mundo de monstros encantados, vi uma gaivota que cantava ao relento.
A gaivota sonhava ser peixe e o peixe sonhava ser mar. Nesse apego em sonhar ser o que não se é, os dias passavam límpidos. Dia após dia desastres impressionantes.

Nunca esquecerei do "Dia do cospe pérolas". Foi o dia em que conchas guardiãs do tesouro se enjoaram com o balanço do mar e todas vomitaram. Pérolas e mais pérolas nadando pelos sete mares. Até surpreender-se era perigoso.

Conta-se que certa tartaruga, boquiaberta com a situação, acabou engolindo três pérolas e morreu. Entaladamente preciosa. Pobre ou rica, fato é que aquele casco não será mais habitado.

A maioria ficou com nojo. Vômito de conchas, todos entoavam.

Ninguém mergulhou por aqueles dias. Não havia quem achasse aquelas dádivas.
Minto, uma pessoa mergulhou. Um pescador velho e alcóolatra. Mas não conta porque não se conta os mortos dentre os vivos. O pescador mergulhou em alto-mar. Ao abrir os olhos e ver aquela corrente de pérolas, achou graça. Pensou que estava sonhando, puxou o ar pelas narinas. Três ou quatro redondinhas lhe entraram pelo nariz. Lá se foi. Entre o sonho, embriaguez e entupimento. Morreu feliz.
Fora ele, ninguém de humano soube do fenômeno.

As conchas, desprestigiadas e vazias, se abriram e abandoram a missão de ser par. Correram, nadaram e se lançaram na beira do mar.
Uma menina chamada Alice juntou oito baldes num só dia, produziu vários colares de concha e hoje vive num luxuoso hotel com a renda.

Curioso foi o fim das pérolas: cairam num abismo e o encheram até a boca. Os peixes as tratam como pedras e elas vivem a redondilhar.
São felizes e viverão para sempre no mar. Preenchedoras de abismos e matadoras de quem estranha essa história.

2 comentários:

Miguel Del Castillo disse...

hahahahahaha
genial a tartaruga entaladamente preciosa.
me diverti.

JT. Almeida disse...

Chega de redondilhar e preencher abismos!!! Eu quero ser colar!!!